Programa

Ementa:
O cuidado refere-se a todas as atividades essenciais à satisfação de necessidades básicas para a reprodução, a existência e a sociabilidade. Todas as atividades desta ordem encontram-se geralmente estruturadas, organizadas e sustentadas na esfera doméstica. Dessa maneira, a família tem sido e continua sendo a principal prestadora de serviços de cuidado e bem-estar. Esse modelo reproduz uma desigualdade estrutural de gênero, uma vez que hierarquiza o público, como uma esfera de produção principalmente masculina, e o privado, como a esfera doméstica de reprodução associada às mulheres. A organização social do cuidado como categoria analítica tem permitido superar os modelos de cuidado focados na maternidade, referindo à maneira pela qual as famílias, o Estado, o mercado e as organizações comunitárias produzem e distribuem inter-relacionadamente os cuidados (Rodríguez Enríquez e Marzoneto, 2015). Estudos desse tipo têm contribuído para entender que, na América Latina e na maioria dos países do mundo, a organização social do cuidado é desigual (Rodríguez Enríquez e Pautassi, 2014) e que no interior dos domicílios, por sua vez, são as mulheres que assumem quase todas essas tarefas. Nessa linha de debates focada na economia feminista ou na economia dos cuidados, o cuidado tem se tornado foco de muitos debates atuais sobre a distribuição de tarefas e responsabilidades na sociedade. Desde diferentes disciplinas, há uma tendência a problematizar seu caráter feminizado, desvalorizado e invisível e, consequentemente, a falta de políticas de cuidado. Se hoje o debate tem conseguido refletir sobre as formas em que as mulheres continuam sendo responsabilizadas pelas tarefas de cuidado que correspondem a sociedade em geral, ainda temos um longo caminho a percorrer pois outras variáveis, além do gênero e da classe social, devem ser foco dessas análises como raça, etnia, sexualidade, geração, entre outras. Embora em outras áreas essas arestas são cada vez mais centrais, elas são frequentemente ignoradas quando revisamos a literatura internacional sobre cuidados, categoria polissêmica e controversa. Nesse sentido, considera-se que algumas perguntas precisam ainda ser respondidas e que elas podem ajudar a traçar novos caminhos no debate sobre cuidados. Quais têm sido as principais controvérsias? Quais as questões que hoje em dia articulam a arena pública com o debate acadêmico e com as demandas dos movimentos sociais? Como pensar o cuidado desde outras epistemologias? Como descolonizar as noções arraigadas à embranquecida categoria de cuidado? Se ao falar de cuidado estamos falando de uma dimensão básica da nossa existência, precisamos, então, discutir o que significa bem-viver. Nessa direção o curso tem por objetivo discutir as principais perspectivas críticas que orientam as abordagens sobre os cuidados e propor novas articulações teóricas a partir das abordagens interseccionais e do feminismo decolonial. Dessa maneira, o curso procura aproximar os e as estudantes à uma definição política do cuidado, articulando velhas e novas discussões e diferentes epistemologias sobre as formas de cuidar da vida/mundo.

Aula 1: Da privatização à politização do cuidado
- A familiarização do cuidado
- A economia feminista e o trabalho de cuidado
- A organização social do cuidado
- A revalorização da esfera doméstica: Redistribuição e reconhecimento
- A “crise dos cuidados” e os cuidados transacionais

BENHABIB, Shila. The Reluctant Modernism of Hannah Arendt. Thousand Oaks-London-New
Delhi, SAGE, 1996
BORGEAUD-GARCIANDÍA Natacha. [Introducción] El trabajo de cuidado /compilado por
Natacha Borgeaud-Garciandía. - 1a ed . - Ciudad Autónoma de Buenos Aires : Fundación
Medifé Edita, 2018.
BRAGE, E. La lógica femenina del cuidado. Cáp. 6: Tesis doctoral. Facultad de Filosofía y
Letras, UBA. (2018)
ESQUIVEL, V., FAUR E. Y JELIN, E, “Hacia la conceptualización de la ‘organización social
del cuidado’”, Buenos Aires: UNICEF-UNFPA-IDES. 2009
FAUR, E, El cuidado infantil en el siglo XX. Mujeres malabaristas en una sociedad desigual. Buenos Aires: Siglo Veintiuno. 2014
FEDERICI, SILVIA. “Teorizando e politizando o trabalho doméstico”. In: O ponto zero da
revolução. Editora Elefante, 2019.
FRASER, Nancy. Da redistribuição ao reconhecimento? Dilemas da justiça numa era “póssocialista”. Cadernos De Campo (São Paulo), 15(14-15), 231-239.
https://doi.org/10.11606/issn.2316-9133.v15i14-15p231-23, 2006
GONZÁLVEZ TORRALBO, Herminia. LOS CUIDADOS EN LA MIGRACIÓN
TRANSNACIONAL. SUR 24 - v.13 n.24 • 43 - 52 | 2016
HIRATA, Helena e ARAUJO GUIMARÃES, Nadya. Cuidado e cuidadoras: as varias faces do
trabalho do care. São Paulo, Atlas, 2012 [Intruducción]
HIRATA, Helena e ARAUJO GUIMARÃES, Nadya. El cuidado en América Latina : mirando
los casos de Argentina, Brasil, Chile, Colombia y Uruguay / [Introducción] - 1a ed . - Ciudad
Autónoma de Buenos Aires: Fundación Medifé Edita, 2020.
MAGLIANO, M. José. Interseccionalidad y migraciones: potencialidades y desafíos. Estudos
Feministas, Florianópolis, 23(3): 691-712, setembro-dezembro/2015
PAUTASSI, L Y ZIBECCI, C. (2013). “Las fronteras del cuidado”. Buenos Aires. Biblos.
RODRÍGUEZ ENRÍQUEZ, C. Y MARZONETTO, G. Organización Social del Cuidado y
Desigualdad: el déficit de políticas públicas de cuidado en Argentina. Perspectivas de Políticas
Públicas, 4(8), 103-134. (2016).
ROSAS, Carolina, BORGEAUD GARCIANDÍA, Natacha, MALLIMACI, Ana Inés y
MAGLIANO, María José Migraciones sur-sur y trabajos de cuidado. Aportes desde el contexto
argentino.

Aula 2: "Da ética do cuidado à cidade cuidadora"
- Da autonomia à interdependência
- A ética do cuidado
- Os arranjos de cuidado
- Cidades cuidadoras

DEBERT, Guita; PULHEZ, Mariana (org.). Desafios do cuidado: gênero, velhice e deficiência.
Campinas: UNICAMP/IFCH, 2017.
FAZZIONI, Natália. Nascer e morrer no Complexo do Alemão: políticas de saúde e arranjos de
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janeiro, Rio de Janeiro, 2018.
HELENE, Diana. ““Eu quero sair daqui!”: do isolamento doméstico a coletivização do
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coronavírus e as cidades no Brasil. 1ed.Rio de Janeiro: Outras Letras, 2020. MOL, Anemmarie. “Care: putting practice in theory”. In: MOL, A.; MOSER, I.; POLS, J. Care
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TRONTO, Joan. Moral boundaries: a political argument for an ethic of care. Londres:
Routledge, 2009.
VALDIVIA, Blanca. “Del urbanismo androcéntrico a la ciudad cuidadora”. In: Hábitat y
sociedade, nº 11, Universidad de Sevilla, noviembre de 2018:64-84

Aula 3: Da economia feminista a um olhar interseccional sobre o cuidado
- Interseccionalidade e consubstancialidade
- A cor, o gênero e a classe das epidemias
- Quem cuida de quem?

HIRATA, Helena. Gênero, classe e raça Interseccionalidade e consubstancialidade das relações
sociais. Tempo soc. [online]. 2014, vol.26, n.1 [cited 2020-06-08], pp.61-73.
AUDRE LORD “Não existe hierarquia de opressão” em: “Pensamento Feminista: Conceitos
Fundamentais”. Org. Heloisa Buqrque de Hollanda. Rio de Jnaeiro: Bazar do Tempo, 2019.
AUDRE LORD “Idade, raça, classe e gênero: mulheres redefinindo a diferença” de em
“Pensamento Feminista: Conceitos Fundamentais”. Org. Heloisa Buqrque de Hollanda. Rio de
Jnaeiro: Bazar do Tempo, 2019.
BEATRIZ NASCIMENTO “A mulher negra e o amor” em “Pensamento Feminista Brasileiro:
Formação e contexto. Org. Heloisa Buarque de Hollanda. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo,
2019.
FEDERICI, Silvia. O Ponto Zero da Revolução: Trabalho Doméstico, Reprodução e Luta
Feminista. São Paulo: Elefante, 2019.
PIMENTA, Denise. Pandemia é coisa de mulher: Breve ensaio sobre o enfrentamento de uma
doença a partir das vozes e silenciamentos femininos dentro das casas, hospitais e na produção
acadêmica. TESSITURAS, V8, S1, JAN-JUN 2020. Pelotas | RS. Disponível em:
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TRONTO, Joan. Riesgo o cuidado?. Buenos Aires: Editora Fundación Medifé, 2020.
VERGÈS, Françoise. Um feminismo Decolonial. São Paulo: Editora UBU, 2020.

Aula 4: O cuidado em chave decolonial
- Uma epistemologia afro latino americana
- Bem Viver
- Comunalidade
- Feminismo comunitario

DA GRAÇA COSTA, Maria “Agroecologia, ecofeminismo e bem viver: emergências
decoloniais no movimento ambientalista brasileieo” em “Pensamento Feminista Hoje:
Perspectivas Decolonial”. Org. Heloisa Buarque de Holanda. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo,
2020.
GONZALEZ, LÉLIA. A categoria político- cultural de amefricanidade. Tempo Brasileiro, Rio
de Janeiro, n. 92/93, p. 69-82, jan./jun. 1988 em: Buarque de Holanda, Heloisa (Org)
“Pensamento Feminista Hoje: Perspectivas Decolonial”. Org.. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo,
2020.
LUGONES, MARIA. Género y colonialidad, Tabula Rasa. Bogotá - Colombia, No.9: 73-101,
julio-diciembre 2008 ISSN 1794-2489
DOS SANTOS, Luciane Lucas « Deve a economia feminista ser pós-colonial? Colonialidade
económica, género e epistemologias do Sul », Revista Crítica de Ciências Sociais [Online],
114 | 2017
KILOMBA, Grada. Cáp. 3 “Quem pode falar?”: Falando no centro. Descolonizando o
conhecimento. Em: Memórias da plantação. Episódios do racismo cotidiano.
CURIEL, Ochy. Construindo metodologias feministas a partir do feminismo decolonial. Em:
Buarque de Holanda, Heloisa (Org) “Pensamento Feminista Hoje: Perspectivas Decolonial”.
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MINOSO, Yuderkys Espinosa. Hacer genealogía de la experiencia: el método hacia una crítica
a la colonialidad de la Razón feminista desde la experiencia histórica en América Latina. Rev.
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RIVERA CUSICANQUI, Silvia. Ch’ixinakax utxiwa. Una reflexión sobre prácticas y discursos
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Julieta Paredes, « El feminismocomunitario: la creación de un pensamiento
propio », Corpus [En línea], Vol. 7, No 1 | 2017
SEGATO, Rita Laura (2014) “La Crítica de la Colonialidad en ocho ensayos. Buenos Aires:
Prometeo, de próxima aparición.