Programa

O cenário caótico da condução das relações exteriores no Brasil tem suscitado intenso debate público sobre a política externa no país. Moldado como o ponta-de-lança de uma “cruzada antiglobalista”, o uso do Itamaraty por políticos e a competição entre o MRE e demais ministérios chocou muitos analistas. Ancorados em uma imagem de excelência da burocracia diplomática brasileira, muitos clamam por uma política externa “técnica” e “livre de ideologia”, a ser formulada pelo Itamaraty. Para além da conjuntura atual: será isso um cenário desejável ou mesmo possível? Como chegamos a essa situação?
O curso pretende discutir criticamente o “declínio” do MRE e os atores e processos envolvidos na produção da política externa brasileira, tendo como questões de fundo a ideia da política externa como política pública e a possibilidade de sua democratização. Para isso, será retomada a trajetória da política externa brasileira pela chave da transformação dos processos decisórios no tempo. Colocando o cenário contemporâneo em uma perspectiva mais ampla, deixando de lado particularidades do governo e da conjuntura atual, vislumbram-se processos mais profundos de transformação: a multiplicação de atores envolvidos com temas internacionais, o aumento do interesse social e político em questões de política externa e uma crescente insatisfação com a diplomacia tradicional.

Calendário e conteúdo das aulas

12/04 - Aula 1. O Itamaraty: decisor técnico e insulado?
Apresentação do curso e de conceitos básicos: o que é política externa, diplomacia como instrumento de política externa. O Itamaraty como ator excepcional e seu papel na formulação da política externa. Estrutura do serviço diplomático, insulamento burocrático e a trajetória histórica do MRE. As ideias clássicas de política externa no Itamaraty. O perfil dos diplomatas e a cultura “aristocrática” no Itamaraty.

14/04 - Aula 2. A Redemocratização e os novos atores: o insulamento questionado
Transformações no Estado brasileiro e nas relações internacionais nos anos 1990 e suas implicações para os processos decisórios em política externa. A multiplicação dos atores e a internacionalização das políticas públicas domésticas. Política burocrática e ministérios como atores internacionais. Discussão de estudos de casos selecionados.

16/04 - Aula 3. Os políticos e a política externa: tensões entre burocracia, sistema político e sociedade
O aumento do debate sobre política externa no Brasil e sua relevância na política doméstica. O presidente e o Congresso como atores de política externa. Movimentações da sociedade civil: o lobby de empresas, ONGs e outros grupos organizados. Embates entre lógica de decisão e concepções de política externa do MRE e da sociedade. Discussão de estudos de caso selecionados.

19/04 - Aula 4. Analisando a cena contemporânea: uma política externa “pós-diplomática”?
Retomada das transformações em curso na diplomacia e na forma da política externa, no Brasil e no mundo. Declínio dos ministérios de relações exteriores no mundo. A linguagem diplomática frente às mudanças tecnológicas e às pressões do público global. Limitações e benefícios da política externa “pós-diplomática”. Especificidades do Brasil atual. Discussões normativas: nesse contexto, qual a melhor forma de construir a política externa brasileira? Qual o papel de um ministério de Relações Exteriores hoje?

Referências Bibliográficas

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FARIA, C. A. P. Opinião pública e política externa: insulamento, politização e reforma na produção da política
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