Programa

1. Poesia e liberdade no cenário português
Na primeira aula será elaborado o reconhecimento de que Herberto Helder, mesmo negando veementemente sua conexão com o Surrealismo, carrega em sua obra um modo de pensar a relação entre poesia e realidade que deve muito a essa vanguarda e ao modo como ela, ao menos em parte, se desviou para o chamado abjeccionismo no cenário ditatorial português. Será mostrado como ali se forjou um modo de pensar o que pode ser esse objeto poema que Helder iria desenvolver e levar adiante ao longo de toda a sua obra.

2. A língua bifurcada de Herberto Helder: poesia e fenomenologia
A questão da relação entre poesia e realidade se desdobra em duas direções: uma que considera o papel e o poder do poema em constituir e reformular o pensamento, as imagens mentais, os elementos da realidade; e outra que considera as relações entre poesia e sociedade. Nesta segunda aula será abordada a primeira direção. Serão vistos, por exemplo, as associações da poesia à magia e à fantasmagoria, considerando, por exemplo, a influência romântica do tema do Absoluto, e as associações também da poesia ao cinema, recorrentes na obra de Helder.

3. A língua bifurcada de Herberto Helder: poesia e sociedade
Nesta aula se dará atenção à segunda daquelas direções: serão vistos os modos de relação que a obra de
Herberto Helder fantasia e os que efetua com o mundo ou com o que ele chama de “real quotidiano” (ou ainda de modos administrativos da linguagem). Será dada atenção também a suas formulações acerca da violência da poesia, principalmente através dos temas do erro e do crime.

4. Poesia e realidade na obra “tardia” de Herberto Helder
A ideia de uma obra “tardia” em Herberto Helder vem da tese de doutorado de Roberto Bezerra de Menezes e se refere aos três últimos conjuntos de inéditos que Helder publicou em vida: A faca não corta o fogo (2008/2009), Servidões (2013) e A morte sem mestre (2014). Nesses livros, segundo minha pesquisa, algumas diferenças na voz, na relação com o real cotidiano e na ironia do poeta levam a reconhecer um desenvolvimento a mais nas diretrizes que guiaram até então a relação entre poesia e realidade em sua obra, e é isso o que será apresentado na última aula do curso.

Referências bibliográficas (nestas referências se encontram alguns dos textos que serão comentados nas aulas, mas elas não cobrem todo o conteúdo das apresentações. Outras referências poderão ser passadas a pedido dos participantes. Alguns dos textos que serão comentados serão enviados via Drive para os participantes):

ARTAUD, Antonin. O teatro e a ciência. Tradução: Ernesto Sampaio. Pirâmide: antologia. Lisboa, n. 1, pp. 6-9,fevereiro, 1959.
BENJAMIN, Walter. O surrealismo: o último instantâneo da inteligência europeia. In.: Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura. Tradução: Sérgio Paulo Rouanet. São Paulo: Brasiliense, 2012. pp. 21-36
BRETON, André. Manifestos do surrealismo. Tradução: Luiz Forbes. São Paulo: Editora Brasiliense, 1985.
CESARINY, Mário. Mensagem e ilusão do acontecimento surrealista. Pirâmide: antologia. Lisboa, n. 1, pp. 1-2, fevereiro, 1959.
_______ (Org.). Textos de afirmação e de combate do movimento surrealista mundial. Lisboa: Perspectivas e Realidades, 1977.
_______ (Org.). Três poetas do Surrealismo. Lisboa: Biblioteca Nacional, 1981.
_______ (Org.). A intervenção surrealista. Lisboa: Assírio & Alvim, 1997.
DAL FARRA, Maria Lúcia. Um devaneio brasileiro. Relâmpago, ano XIX, n. 36/37, pp. 119-135, abril/outubro, 2015.
GUEDES, Maria Estela. Herberto Helder – é e não é um poeta surrealista. A Ideia: revista de cultura libertária, Évora, II série, v. 16, n. 71-72, pp. 79-81, outono, 2013.
HELDER, Herberto. Poema. Pirâmide: antologia. Lisboa, n. 2, pp. 19-20, junho, 1959.
_______. (Org.) Edoi Lelia Doura: antologia das vozes comunicantes da poesia moderna portuguesa. Lisboa: Assírio & Alvim, 1985.
_______. Cinemas. Relâmpago, n. 3. Lisboa: Fundação Luis Miguel Nava, out., 1998. pp. 7-8
_______. Os passos em volta. Rio de Janeiro: Azougue, 2005a.
_______. [s/t]. Telhados de vidro. Lisboa: Averno, n. 4, 2005b. pp. 111-116
_______. Poemas completos. Rio de Janeiro: Tinta-da-china, 2016.
_______. Photomaton & Vox. Rio de Janeiro: Tinta-da-china, 2017b.
JOAQUIM, Ana Cristina. Real e realidade híbridas: Herberto Helder entre a pedagogia e o crime. eLyra, n. 13, pp. 169-189, junho, 2019.
LEAL, Izabela. A poesia deve ser feita por todos, por um só ou contra todos? – Do surrealismo a Herberto Helder. Revista Gândara 1, 2005. Disponível em: < http://www.letras.puc-rio.br/unidades&nucleos/catedra/revista/gandara_0…;. Acesso em: 18 mar. 2021.
LÖWY, Michael. A estrela da manhã: surrealismo e marxismo. Tradução: Eliana Aguiar. São Paulo: Boitempo, 2018.
_______. O cometa incandescente: romantismo, surrealismo, subversão. Tradução: Diogo Cardoso e Elvio
Fernandes. São Paulo: 100/cabeças, 2021.
GUINZBURG, J., LEIRNER, S. (Orgs.). O Surrealismo. São Paulo: Perspectiva, 2008.
SOUSA, Rui. A presença do abjecto no surrealismo português. Lisboa: Esfera do Caos Editores, 2016.