Programa

Sessão 1: O Gênero dos arquivos coloniais
Nesta sessão introdutória, consideraremos uma visão dos estudos recentes de gênero e discutimos as
formas como ela se cruza com a disciplina de história da África. A definição de gênero de Nancy Hunt é
relevante aqui como uma abordagem à historiografia que leva o gênero para além da mera prescrição
de papéis sociais a homens e mulheres. Além de papeis, procuraremos abordar o gênero como
ferramenta e articulação de poder em contextos históricos específicos que mudam noções de diferença
sexual e possibilidades de identidade. O gênero, neste sentido, no seu emaranhado com raça, idade e
classe, enquadra relações de poder e controle sob regimes coloniais, bem como informa estratégias de
resistência a este poder e as condições para o superar.
Tendo isso em mente, consideraremos os debates na historiografia que centram o gênero como uma
tecnologia do poder colonial e uma ferramenta de inscrição, enquadrando o arquivo como um aparato
de sujeição. As questões orientadoras nesta sessão serão: como o gênero é produzido? É possível
pensar o gênero é uma metáfora, ou seja, uma forma de ver/falar? Como o gênero orienta as relações
sociais, as normas e os rituais em diferentes contextos coloniais? Que alternativas uma história pré-
colonial pode oferecer aos estudos de gênero em contextos africanos? Quais são os potenciais e limites
da noção de agência de mulheres, pessoas queer e demais sujeitos coloniais?

Sessão 2: Arquivos de domesticidade, cuidado e trabalho reprodutivo
Para esta sessão nos voltaremos ao estudo da prostituição e lutas de mulheres e homens africanos
para recuperar e garantir as suas reivindicações de habitação doméstica em ambientes urbanos.
Observamos como as vidas íntimas foram conectadas e moldadas por processos mais amplos de
mudança social e política. Exploraremos os escritos históricos comparativos da Índia colonial tardia e a
representação do interior doméstico, da escrita de mulheres e o arquivo como habitação.
Na segunda parte desta sessão, discutiremos como os governos do Congo Belga e do apartheid da
África do Sul tentaram intervir na gestão da reprodução e do sexo através de políticas de nascimento e
da amamentação, bem como as implicações desse controle para a nossa compreensão do gênero e da
maternidade. Consideraremos as formas como o regime legal foi exercido em relação às mulheres
“europeias” e “africanas”, como mudou as noções do que é considerado contracepção natural e artificial,
e como as mudanças nas práticas contraceptivas revelam os limites movediços das esferas publica e
privada.

Sessão 3: Sexo, intimidade, respeitabilidade
Nesta sessão veremos como as concepções de casamento, o domínio colonial e as políticas destinadas
às populações “nativas” transformam a autoridade geracional. Abordaremos a negociação de poder nas
famílias e os papéis de gênero e como foram entendidos como tradicionais. Na intersecção dos
processos legais e a construção do Estado colonial, esta sessão explora como os discursos de gênero
estão emaranhados nas hierarquias coloniais de idade, gênero e raça bem como do direito e autoridade
costumeiros.
No âmbito familiar, exploraremos como a noção de idade, de infância ou juventude podem ser um
registro analítico importante na construção de gênero, e nas mudanças históricas nas relações entre
parentesco e a estrutura de costumes sob domínio colonial.

Sessão 4: Viuvez, morte e outras heranças coloniais
Na última sessão discutiremos a mudança das terminologias de gênero através da herança colonial –
figurativa e literalmente – na vida social das mulheres. Exploraremos como a viuvez molda dinâmicas
sociais entre as viúvas, as suas famílias, sua comunidade, missionários e autoridades coloniais. A
sessão centra-se na relação entre as viúvas e suas filhas e como o impacto das políticas coloniais de
educação e recrutamento militar de homens transformam as aspirações de mulheres jovens.
A parte final trata das questões da morte no arquivo colonial e dos limites da representação da violência.
Através do relato do historiador e dos limites da representação historiográfica, veremos nos casos
estudados como o colonialismo não foi apenas produzido através da violência extrema, mas sustentado
através de negociações e discursos de poder.

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